domingo, 31 de janeiro de 2021

Rede De Viação Fluminense - Introdução às Ferrovias no Vale Do Paraíba

Nos primórdios das ferrovias no Brasil, um decreto de 27 de abril de 1866 concedia a Companhia Estrada De Ferro União Valenciana a autorização para a construção de uma estrada de ferro que ligasse Desengano (Barão De Juparanã) no vale do paraíba fluminense a Rio Preto. 

Em contrapartida, a Linha Do Centro da Estrada Dom Pedro II finalmente chegou a Comércio, (Sebastião de Lacerda) em Vassouras onde inaugurou sua primeira estação em 27 de novembro 1866.

Observação: a E.F. União Valenciana foi construída inicialmente em bitola de 1,10m sendo reduzida posteriormente para 1,00m enquanto a Linha Do Centro utilizava a bitola larga com 1,60m (permanecendo nessa medida até os dias atuais).


O primeiro trecho da Estrada De Ferro União Valenciana entre Barão De Juparanã e Marquês De Valença com 25 quilômetros de extensão foi aberto ao tráfego em 18 de maio de 1871. O prolongamento da linha dependia de estudos sobre o traçado a ser seguido, por isso o trecho até Rio Bonito só foi entregue em 1879, e até Rio Preto em 1880.

ESTAÇÕES DA ESTRADA DE FERRO UNIÃO VALENCIANA (1871 - 1910)

- Barão De Juparanã (Desengano)
- Quirino
- Carvalho Borges
- Esteves
- Chacrinha
- Valença (Marquês De Valença)
- Vila Pentagna (Rio Bonito)
- Alberto Furtado (Santa Delphina)
- Duque (Coutinho)
- Parapeúna (Rio Preto)

Alguns anos antes, em 14 de setembro de 1875 foram aprovados os estatutos da Companhia Estrada De Ferro De Comércio a Rio Das Flores para que a mesma construísse uma ferrovia partindo da localidade de Comércio no município de Vassouras até Santa Teresa (atual Rio Das Flores).

A preparação do leito da ferrovia para o assentamentos dos trilhos teve inicio em 1876 na localidade de Comércio (Sebastião De Lacerda) paralela a Linha Do Centro da E.F. Dom Pedro II onde inclusive já havia uma estação para atender a mesma. Diferente da Linha Do Centro em bitola larga de 1,60m a E.F. Rio Das Flores foi construída em bitola métrica 1,00m.


A linha que saía da estação Sebastião De Lacerda no Ramal De Rio Das Flores passava por uma pequena parada identificada apenas como "Marambaia" (sem maiores informações). 

Em Taboas além de uma estação foram construídos depósitos e galpões para a oficina de vagões e locomotivas daquele ramal.


Em 7 de agosto de 1885 a Companhia Estrada De Ferro De Comércio a Rio Das Flores foi dissolvida e após sua reestruturação a companhia passou a se chamar Estrada De Ferro Rio Das Flores. 

Na segunda seção da Estrada De Ferro Rio Das Flores os trilhos alcançaram a estação de Santa Teresa (atual Rio Das Flores), e em seguida foram inauguradas as estações de Santa Fé, Cachoeira Do Funil, Paraíso, Manuel Duarte, Santa Rosa, Guarda Fernandes, e por último Três Ilhas.

ESTAÇÔES DA ESTRADA DE FERRO RIO DAS FLORES (1882 -1922)

- Sebastião De Lacerda (Comércio)
- Marambaia
- Taboas
- Rio Das Flores (Santa Teresa)
- Santa Fé (Eloy De Andrade)
- Cachoeira Do Funil
- Paraíso
- Manuel Duarte (Porto Das Flores)
- Santa Rosa 
- Guarda Fernandes (Independência)
- Três Ilhas

Rio Das Flores surgiu no território do município de Marquês de Valença sob o nome de "Freguesia de Santa Teresa de Valença", seu crescimento veio em decorrência do sucesso durante o ciclo do café em meados do século XIX. Em 1883 a região foi agraciada com a passagem de uma estrada de ferro para escoar a produção cafeeira, antes de receber o nome de "Rio Das Flores", sua principal estação foi chamada de Santa Teresa em homenagem a santa padroeira da freguesia ali estabelecida por seus primeiros colonos.

Em 17 de março de 1890 a freguesia foi emancipada do município de Valença sendo chamada inicialmente de Vila de Santa Teresa. 


A Rede De Viação Fluminense foi criada em 1910 quando a Estrada De Ferro Central Do Brasil (antiga E.F. Dom Pedro II), proprietária da Linha Auxiliar adquiriu a E.F. União Valenciana. 

Durante o prolongamento da E.F. União Valenciana até Santa Rita Do Jacutinga aconteceu uma explosão na estação de Alberto Furtado (antiga Santa Delphina); Enquanto um trem de serviço era descarregado, um vagão com cinco toneladas de dinamite explodiu, ceifando várias vidas. 

Neste empreendimento a bitola foi reduzida de 1,10m para 1,00m possibilitando que em 1914 a partir da estação de Governador Portela na Linha Auxiliar fosse aberto um entroncamento com o "Ramal De Jacutinga" utilizando grande parte da antiga E.F. União Valenciana.

O Ramal De Jacutinga era uma linha que ligava o interior sul fluminense, ao sul de Minas Gerais através da região do vale do paraíba com a finalidade de alcançar o município de Santa Rita Do Jacutinga passando por Vassouras e Valença.

ESTAÇÕES DO RAMAL DE JACUTINGA (1914 - 1970)

- Governador Portela
- Monsores
- Morro Azul
- Sacra Família
- Barão Do Amparo (Palmital)
- Engenheiro Nóbrega
- Vassouras
- Barão De Vassouras
- Barão De Juaranã (Desengano)
- Quirino
- Carvalho Borges
- Esteves
- Chacrinha
- Valença (Marquês De Valença)
- General Osório
- Santa Ignácia
- Vila Pentagna (Rio Bonito)
- Coroas
- Guimarães
- Alberto Furtado (Santa Delphina)
- Duque (Coutinho)
- Parapeúna (Rio Preto)
- Fernandes Figueira (São Luiz)
- Coronel Cardoso
João Honório (Santa Clara)
- Barbosa Gonçalves
- Santa Rita Do Jacutinga

Encampada pela Estrada De Ferro Central Do Brasil em 1922, a E.F. Rio Das Flores construída em bitola métrica 1,00m foi incluída como parte da Rede De Viação Fluminense, passando por modificações que deram origem ao Ramal De Afonso Arinos.

Na linha da antiga E.F. Rio Das Flores o trecho entre Comércio (Sebastião De Lacerda) e Taboas foi suprimido sendo transformado em estrada de rodagem. O Ramal De Afonso Arinos, tinha início na estação Marquês De Valença, aproveitando a linha da E.F. Rio Das Flores e se prolongando até a estação de Barra Longa em Levy Gasparian.

Nos arredores da estação de Valença os galpões que serviam como depósitos para vagões e locomotivas passaram a atender o Ramal De Jacutinga e o Ramal De Afonso Arinos.

ESTAÇÔES DO RAMAL DE AFONSO ARINOS (1922 - 1965)

- Valença (Marquês De Valença)
- Engenheiro Dunham
- Taboas
- Machado Da Cunha
- Rio Das Flores (Santa Teresa)
- Santa Fé (Eloy De Andrade)
- Cachoeira Do Funil
- Paraíso
- Manuel Duarte (Porto Das Flores)
- Santa Rosa
- Guarda Fernandes (Independência)
- Santa Justa
- Três Ilhas
- São Fidelis
- Engenheiro Carvalhães
- Santa Malfada
- Affonso Arinos (Barra Longa)

As estações de São Fidélis, Engenheiro Carvalhães, Santa Mafalda e Afonso Arinos (antiga Barra Longa) foram abertas pela E.F. Central Do Brasil por volta de 1911 para atender uma possível variante da Linha Do Centro que já utilizava bitola larga de 1,60m como padrão, entretanto esse trecho que agora fazia parte do Ramal De Afonso Arinos teve a bitola reduzida para métrica como a Linha Auxiliar, o Ramal De Jacutinga e a antiga E.F. Rio Das Flores, incorporada a esse novo ramal.

Em 1920 a então estação de Barra Longa foi reinaugurada como Afonso Arinos, ponto final do ramal de mesmo nome e entroncamento com a Linha Do Centro da E.F. Central Do Brasil que a partir deste ponto entrava em território mineiro.

Na Linha Do Centro a estação de Afonso Arinos fica localizada entre as estações de Paraibuna e Sobragi pois no entroncamento com o Ramal De Afonso Arinos a linha que seguia até Valença foi desativada em 1965 tendo seus trilhos arrancados.

Com a desativação do Ramal De Afonso Arinos (ex E.F. Rio Das Flores) em 1965 e do Ramal De Jacutinga (ex E.F. União Valenciana) em 1970, a Rede de Viação Fluminense se dissolveu restando apenas a Linha Auxiliar da E.F.C.B. sob administração da E.F. Leopoldina até 1975 quando foi incorporada a Rede Ferroviária Federal RFFSA.


quarta-feira, 27 de janeiro de 2021

O Futuro Incerto do Trem em Miguel Pereira

A Linha Auxiliar, construída inicialmente pela Estrada De Ferro Melhoramentos Do Brasil chegou a possuir 240,108 quilômetros de extensão, sendo 75,560 quilômetros localizados dentro do município de Miguel Pereira. 

Atualmente o único trecho operacional está preservado graças a Associação Fluminense de Preservação Ferroviária AFPF que vem lidando com invasões na linha, obstruções e uma recente alteração de bitola que reduziu o trecho ao mísero número de 1,15 quilômetros.

Em 2015 numa tentativa de reativação parcial da linha para fins turísticos o trecho de 4,484 quilômetros entre as estações de Miguel Pereira e Governador Portela teve a bitola alterada de 1,00 (métrica) para 1,60 (larga), isolando completamente o material rodante pertencente a AFPF que costumava fazer esse percurso. 

Na época a única opção disponível para o projeto de um trem turístico envolvia uma automotriz diesel hidráulica de bitola larga da ONG Amigos do Trem, mas por falta de comprometimento das partes envolvidas, tudo foi abandonado.

Por questões políticas o novo prefeito se negou a dar continuidade ao projeto embora tenha se mostrado interessado na implantação de um trem turístico desde que fosse com uma locomotiva a vapor bem como as que fizeram história na cidade. O que deu início a uma caça por uma locomotiva a vapor em condições operacionais.

A automotriz conhecida como litorina foi impedida de circular por diversos motivos: a linha em bitola larga foi construída com uma série de irregularidades técnicas; Durante uma avaliação da ANTT agência nacional de transportes terrestres a litorina apresentou defeitos em um dos motores; E em nenhum momento a ONG Amigos do Trem proprietária da litorina conseguiu cumprir as exigências que pensariam a favor do projeto apesar do impasse político.

Sob a gestão do prefeito André Português em Miguel Pereira foi realizada uma parceria com a Fecomércio, Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Rio de Janeiro que cedeu para o novo projeto turístico uma locomotiva a vapor e quatro carros de passageiros (vagões), mas seria preciso reduzir a bitola para métrica tal qual seu formato original, ou adicionar um terceiro trilho para transformar a linha em bitola mista, que permitiria a circulação tanto da Litorina quanto da "Maria Fumaça" que aliás e da mesma bitola do trenzinho da AFPF.

A possibilidade de permitir a circulação da litorina através da bitola mista levou a decisão de restaurar a bitola métrica em toda a linha. Esse empreendimento sairia muito caro, então foi realizada uma licitação para empresas interessadas em assumir o projeto e administra-lo durante certo tempo, entretanto nenhuma empresa se manifestou interessada, aliado a isso surgiu a pandemia e o foco mudou completamente, as atenções se voltaram às medidas sanitárias e o período eleitoral, até que o prefeito André Português foi reeleito, fato que não mudou em absolutamente nada a situação do projeto do trem.

Não há como esconder a decepção em ver mais um trem abandonado sob sol e chuva, sem manutenção e com segurança precária. Se nenhuma empresa manifestou interesse no trecho devido a quantidade de adaptações necessárias, a prefeitura deveria dar um salto de fé nesse projeto e investir pelo menos na readequação dos 4,484 quilômetros de linha entre Miguel Pereira e Governador Portela e divulgar a viabilidade de um projeto mais simples, e conforme obtivesse retorno financeiro, poderia cobrir os gastos e atrair investidores.

O projeto de rebitolagem que permitiria a circulação da "Maria Fumaça" inclui a reconstrução do triângulo de reversão em Governador Portela e a construção de um girador de locomotivas no centro da cidade, ambos com a finalidade de inverter o sentindo da máquina de acordo com a direção do trem. 

A frustrante licitação realizada sem sucesso fez parecer que a ideia mirabolante como de reativar 29,438 quilômetros de linha entre as estações de Miguel Pereira e Conrado poderia atrair grandes empresas para assumir essa missão sem levar em conta que estamos lidando com uma realidade bem diferente de 25 anos atrás quando a linha ainda estava intacta e era possível controlar pequenos incidentes.

E muito triste dizer isso mas e algo inviável! O trecho da Linha Auxiliar na região da serra de Miguel Pereira está inativo desde 1997, quase não há mais trilhos, o leito da ferrovia sofreu deslizamentos, algumas estações foram demolidas, as que resistiram foram descaracterizadas, e o Viaduto Paulo de Frontin que seria a maior atração do percurso possui 134 anos.

Conhecido popularmente como "ponte de Vera Cruz" o Viaduto não passa por qualquer tipo de manutenção há 25 anos, desde quando o ramal foi desativado. Reconhecido como parte do patrimônio Belga no Brasil, mesmo com uma possível reativação da linha, e provável que o tráfego de trens sobre essa estrutura fosse proíbido devido o desgaste e os riscos de acidente, ou seja, não há chances por mais otimistas de que esse trecho da ferrovia possa ser reconstruído.

Para um projeto nessas proporções os gastos em levar a linha até Conrado poderiam chegar a 100 milhões. Então e melhor manter os pés no chão, dar importância ao que realmente importa e fazer tudo que estiver ao alcance para não repetir os erros do passado. 

Após analisar essas informações pode parecer que não há esperanças, mas e possível sim colocar esse trem para funcionar por um valor bem menor, basta manter o percurso na região plana que apesar de estar em área urbana, tem sim suas belezas. 

O trecho entre a estação de Paty Do Alferes e Governador Portela possuí 10,718 quilômetros de extensão, não há invasões, os trilhos estão preservados e a única necessidade e a construção de uma pequena ponte onde foi aberta uma passagem ao lado do antigo "pontilhão" em Paty.

Caso o prefeito queira manter o trem apenas no município de Miguel Pereira, basta ter um pouco de boa vontade e começar ajudando a AFPF com a reintegração dos trilhos soterrados a partir da entrada do bairro lagoinha. E desenterrar os trilhos até a divisa entre Miguel Pereira e Paty Do Alferes na antiga parada de Pedras Ruivas.

Outro ponto importante que foi muito criticado diz respeito aos carros de passageiros que vieram junto com a locomotiva pois na verdade são vagões leito, usados como dormitórios. Até os engates são incompatíveis, pois para formar uma composição e preciso que todos os vagões estejam conectados uns aos outros e a locomotiva de forma segura.

Tanto a locomotiva a vapor quanto os vagões vieram do Sesc Grussaí em São João da Barra RJ, onde existem mais quatro locomotivas semelhantes e diversos vagões próprios para o transporte de passageiros. 

A locomotiva N° 220 estava em condições operacionais, precisando apenas de reparos estéticos, mas os vagões leito vieram com a justificativa de que seriam reformados pela empresa que assumisse a operação do trem turístico. Como a licitação foi um fracasso o trem permanece parado na estação de Portela sem os devidos cuidados.

Nem tudo são perdas, ter uma "Maria Fumaça" como atração mesmo estática não deixa de ser um atrativo turístico, temos como exemplo a cidade de Vassouras, Conservatória em Valença, Nogueira em Petrópolis, e tantos outros lugares onde um trem mesmo parado vira cartão postal pois tem seus méritos reconhecidos, formam a identidade cultural de um lugar.

Em fevereiro de 2020 foi reinaugurado o museu ferroviário de Miguel Pereira que devido a pandemia não pode ficar aberto a visitação pública. Espera-se que com o controle da transmissão do covid-19 a prefeitura permita o acesso ao acervo reunido na antiga estação. Aliás o acervo e tão grande que precisou ser dividido e algumas peças se encontram no pórtico em Governador Portela.

Aos amigos e seguidores que acompanham o projeto do Vagão sabem das dificuldades enfrentadas para regularizar a documentação e impedir que o mesmo fosse sucateado.

O vagão foi cedido a mim Matheus Figueiredo pela Vli/FCA com autorização do DNIT departamento nacional de infraestrutura e transporte para preservar, restaurar e transformar o velho vagão em um museu ferroviário vinculado ao Blog Trem Da Serra Do Rio De Janeiro.

Embora muitos tenham se mostrado solidários a causa e ao meu empenho em cuidar desse vagão, nem o prefeito André Português ou seus vereadores apoiaram de fato esse projeto particular que apesar disso seria uma atração a mais para o município de Miguel Pereira.

Houve quem prometesse ajudar a conseguir patrocinadores e alcançar o valor de 10 mil reais, mas bastou passar a eleição para a conversa mudar, foi proposto que com uma doação simbólica eu fizesse algo como uma feijoada e uma live de pagode para angariar fundos e multiplicar o valor "investido". Não tenho nada contra mas esse não e o tipo de evento que desejo associar a imagem do meu Blog e do meu projeto que como já foi divulgado anteriormente segue o estilo retrofuturista SteamPunk, algo completamente diferente de manifestações populares carnavalescas e fora do contexto ferroviário.
 
O Blog Trem Da Serra Do Rio De Janeiro e uma empresa particular que através do vagão tem o objetivo de criar um museu ferroviário temático e interativo, funcionando de maneira independente, sem qualquer relação com o museu ferroviário municipal ou as tentativas de implantação de trens turísticos.

O futuro do que restou da nossa ferrovia ainda e incerto, o pátio de Governador Portela segue silencioso, sem a escandalosa buzina da litorina, o charmoso apito da Maria Fumaça, e o soar do sino anunciando a chegada de mais um trem.

Nessa estação de encontros e despedidas jaz o sonho de apreciar a nostalgia que somente o trem sabe despertar nas almas de quem teve a oportunidade de conhecê-lo e na imaginação de quem nunca teve esse privilégio.