No início do século XVII após transpor a Serra do Tinguá através do Caminho Novo de Garcia Rodrigues Paes chegava-se a uma região formada pelas sesmarias de Francisco Tavares, Fernando Dias, José Leite, Manoel Freire e José de Azevedo.
Segundo registros dos "Caminhos e Roteiros nas Capitanias do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas", o alferes português Francisco Tavares consta como mais antigo sesmeiro da região, responsável por patrulhar esse território até então inexplorado, criando inclusive as primeiras lavouras afim de garantir mantimentos para as tropas que ali prestavam serviço. Dessa forma o povoado ficou conhecido como Roça do Alferes.
Em 1709 Francisco Tavares casado com Isabel Corrêa de Oliveira foi promovido a capitão mor do trecho do Caminho Novo entre a Serra de Tinguá e o rio Paraíba do Sul estabelecendo como centro administrativo da região sua propriedade às margens do Caminho Novo.
Em 13 de abril de 1739 foi fundada a Vila de Nossa Senhora da Serra Acima da Roça do Alferes com sede no Sítio do Alferes, tendo a colaboração do também alferes e tabelião Leonardo Cardoso da Silva.
Ainda em 1739 o capitão Francisco Tavares atendeu um pedido do Frei Francisco de S. Jerônimo, permitindo que o oratório de sua propriedade conhecida como Sítio do Alferes fosse utilizado como capela curada até que houvessem recursos para se erguer uma capela sob invocação a Nossa Senhora da Conceição.
Provisoriamente o alferes Francisco Tavares permitiu a utilização de sua capela, e percebendo o aumento da população, generosamente cedeu o terreno no antigo centro da Vila de Nossa Senhora da Serra Acima da Roça do Alferes para a construção de uma capela e posteriormente da igreja matriz de Nossa Senhora da Conceição.
A capela foi elevada a condição de paróquia em 1755, e a "Vila de Nossa Senhora da Serra Acima da Roça do Alferes" se tornou "Freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Alferes". Logo a propriedade do capitão Francisco Tavares passou a se chamar Fazenda Freguesia.
Algum tempo depois o capitão Francisco Tavares vendeu a Fazenda Freguesia para o também alferes e depois capitão Leonardo Cardoso da Silva proprietário das fazendas: Maravilha, Santa Tereza, e Cachoeira.
No início do século XIX, as fazendas Freguesia e Maravilha, agora de propriedade do capitão Leonardo Cardoso ocupavam juntas uma área de 547 alqueires e contavam com 452 escravos para os serviços domésticos e nas lavouras de café.
Logo as fazendas Freguesia e Maravilha foram adquiridas pelo capitão mor Manuel Francisco Xavier nascido na Ilha do Faiol em Portugal e casado desde 1804 com Francisca Elisa Xavier nascida na região da Roça do Alferes subordinada a Vassouras.
O Caminho Novo de Garcia Paes atravessava as terras da Fazenda Freguesia, mais precisamente o centro administrativo da propriedade, onde ficavam as principais construções. Era costume que guardas e tropeiros fizessem parada nesse local para pernoite antes de seguir viagem em direção as Minas Gerais ou a capital de São Sebastião do Rio de Janeiro.
Em 1820 a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição do Alferes passou a se chamar Vila de Paty do Alferes, esse nome parece ter surgido pelo fato de haver uma abundante quantidade de palmeiras patioba (Syagrus botryophora) ou "pati" na propriedade fundada pelo alferes Francisco Tavares. Outra possibilidade aponta que as palmeiras foram associadas aos alferes que patrulhavam o Caminho Novo e frequentemente eram vistos descansando à sombra de suas grandes folhas, e dessa forma surgiu o nome da localidade.
Insatisfeito com a movimentação em suas terras o capitão mor Manuel Francisco decidiu impedir a passagem alegando que era prejudicial a suas plantações, e sob protesto de outros fazendeiros das redondezas, precisou recorrer ao Príncipe Regente para autorizar a abertura de uma rota alternativa que contornasse a entrada de sua propriedade, entretanto seu pedido foi sustado por vossa alteza.
Apesar do temperamento hostil do capitão Manuel Francisco em contraste com a benevolência de sua esposa dona Francisca Elisa, ambos foram de grande importância para a expansão da Roça do Alferes, inclusive através da doação de recursos para edificação da igreja de Nossa Senhora da Conceição.
O capitão mor Manuel Francisco e sua esposa dona Francisca Elisa não tiveram filhos biológicos, entretanto criaram oito crianças abandonadas às portas da fazenda: Manuel Francisco Xavier Filho, Gil Francisco Xavier, Francisco Manuel Das Chagas Xavier, José Maria Xavier, Carolina Francisca Xavier, Belmira Francisca Xavier, Luzia Francisca Xavier, e Francisca Elisa Xavier que recebera o mesmo nome de sua mãe adotiva. Segundo os comentários da época, essas crianças seriam filhos do capitão com outras mulheres.
A fotografia mais antiga da fazenda mostra a disposição das construções no período do ciclo do café tendo em primeiro plano uma área aberta conhecida como "terreirão" para a secagem dos grãos de café, e ao lado um armazém com telhado rebuscado em oito águas.
Do outro lado do terreirão de café está uma construção em "L" cujo o lado menor era usado como baia para cavalos enquanto o longo galpão servia de alojamento para os capatazes além de um prédio que unia essa construção com a casa sede.
O exterior da casa sede permanece com a maior parte das características originais. Sua fundação foi feita sobre alicerce de pedras sem porão subterrâneo, e com paredes de pau a pique reforçadas para sustentar as enormes toras de madeira necessárias para a construção do pavimento superior.
A fachada conta com uma dupla escadaria sobre um portal que dá acesso ao pátio interno onde há uma passagem para o pavimento térreo onde ficavam os quartos das mucamas e cativos que tinham o privilégio de residir na casa sede.
Algumas janelas foram reposicionadas ou convertidas em portas ao longo do tempo de acordo com a utilização do cômodo onde estavam localizadas.
A entrada da fazenda ficava do outro lado do rio, sendo um local de parada para tropeiros e suas comitivas. Talvez houvesse algum tipo de rancho para pernoite pois analisando as poucas imagens existentes da fazenda, sempre houve uma pequena casa alguns metros antes da pequena ponte sobre o rio do saco.
Após cruzar essa pequena ponte, havia um caminho que atravessava uma passagem coberta no lado mais longo da construção em "L" citada anteriormente, e assim se chegava ao quintal da propriedade onde estavam as principais construções.
Marca a história dessa fazenda um acontecimento em especial, conhecido como a "Revolta de Manoel Congo", resultado da negligência do capitão mor em relação as ações cruéis de seus capatazes com os escravizados, fato recorrente e de conhecimento de outros fazendeiros inclusive de Francisco Peixoto Lacerda Werneck, personalidade influente que mais tarde receberia o título de segundo barão de Paty Do Alferes.
Era comum que os cativos se deslocassem entre as fazendas vizinhas Freguesia e Maravilha, ambas de propriedade do capitão mor Manuel Francisco. Mas no dia 5 de novembro de 1838 quando um escravo africano conhecido como Camilo Sapateiro se encaminhava para a Fazenda Maravilha sem autorização, foi covardemente morto a tiros por um capataz de nome Jacques Crioulo, um "mestiço" que além de livre era homem de confiança do capitão mor, que por sua vez não tomou nenhuma atitude para punir seu empregado, gerando extrema revolta por parte dos outros escravos.
Por volta da meia noite a senzala da Fazenda Freguesia teve suas portas arrombadas por 80 homens escravizados dispostos a fazer justiça. Com a ajuda das escravas que dormiam na casa sede foi fácil ter acesso ao paiol de armas onde havia garruchas, facões e foices e mantimentos para os longos dias de fuga.
Embora estivessem armados, o principal uso das foices e facões consistia em abrir caminho em meio a mata fechada e se defender, jamais atentar contra a vida de outras pessoas.
O grupo se embrenhou nas matas e na noite seguinte invadiu a Fazenda Maravilha arrombando a senzala e reunindo outros escravos que ao longo do caminho ajudaram a invadir a Fazenda Pau Grande de propriedade do Sr Paulo Gomes Ribeiro de Avelar, onde haviam mais escravos dispostos a se aliar a causa.
Estima-se que entre 300 e 400 escravos estivessem a solta nas redondezas sob a liderança de Manoel Congo, e de sua companheira Mariana Crioula, ambos escravos da Fazenda Freguesia.
Manoel Congo era africano e foi comprado pelo capitão mor diretamente no armazém de escravos do Cais do Valongo na província do Rio De Janeiro. Executava o trabalho de ferreiro, e ao longo de sua breve vida, teve uma filha chamada Concórdia com a escrava Balbina Conga, também de origem africana.
Mariana Crioula nasceu no Brasil, provavelmente nas redondezas da Vila de Paty Do Alferes. Era costureira e mucama de Dona Francisca Elisa Xavier e por ser uma "preta de estimação" tinha o privilégio de residir na casa sede da fazenda.
Afim de capturar os escravos fugitivos, coube ao capitão mor Manuel Francisco solicitar ajuda ao tenente coronel José Pinheiro de Souza Werneck que na ocasião era o juiz de paz da então freguesia de Paty Do Alferes; Mas foi seu primo, o coronel Francisco Peixoto Lacerda Werneck que como chefe da 13ª legião da guarda nacional providenciou o envio de 160 homens para auxiliar na captura de forma pacífica.
Liderada pelo coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck, em 10 de novembro a tropa partiu da Fazenda Maravilha tendo como integrantes os guardas armados e os capatazes mais experientes, que não tiveram dificuldades para encontrar os rastros de fuga. Os escravos mais velhos, as mulheres grávidas e as crianças formavam um pequeno grupo que foi o primeiro a ser recuperado sem qualquer resistência.
Dias depois, os integrantes do grupo liderado por Manoel Congo e Mariana Crioula ao perceberem que haviam sido encontrados, se prepararam para a luta deixando claro que estavam dispostos a morrer ao entoar falas marcantes como a corajosa "atira caboclo, atira diabos" e "morrer sim, entregar não".
Houveram perdas de ambos os lados, como a morte de dois guardas e sete escravos. Muitos dos sobreviventes só caíram após ter as pernas acertadas por tiros, e os poucos que tiveram a sorte de escapar foram capturados nos dias seguintes.
Somente um pequeno grupo liderado por um escravo chamado João Angola que não havia comparecido no ponto de encontro marcado por Manoel Congo conseguiu se evadir para longe.
Dos 300 a 400 fugitivos apenas dezesseis foram levados a julgamento: Manoel Congo, Pedro Dias, Vicente Moçambique, Antônio Magro, Justino Benguela, Belarmino, Miguel Crioulo, Canuto Moçambique, Afonso Angola, Adão Benguela, Marianna Crioula, Rita Crioula, Lourença Crioula, Joanna Mofumbe, Josefa Angola e Emília Conga. Todos eles eram escravos do capitão mor Manuel Francisco Xavier.
Os réus foram conduzidos presos a ferros em carros de boi até a praça da igreja matriz da Vila de Vassouras cujo a freguesia de Paty do Alferes era subordinada.
O julgamento aconteceu entre os dias 22 e 31 de janeiro de 1839 na Casa Câmara e Cadeia de Vassouras onde os réus permaneceram sob custódia nas celas do prédio ainda em construção.
Manoel Congo foi apontado como líder da rebelião, sendo condenado a execução, outros sete réus foram condenados a "650 açoites cada um, dados a cinquenta por dia, na forma da lei", e a "três anos com gonzo de ferro ao pescoço". Já Mariana Crioula acabou sendo absolvida a pedido da sua dona Francisca Elisa Xavier, porém como punição lhe fora obrigado assistir a execução de seu companheiro no dia 6 de setembro de 1839.
Consta no álbum "Galeria dos Condenados" (Vol.2) acervo da Fundação Biblioteca Nacional do Brasil, a única fotografia existente de Manoel Congo. Esse registro foi realizado logo após sua condenação, e até o momento era desconhecido do público assim como o verdadeiro rosto do valente líder da maior revolta de escravos do Rio De Janeiro.
Manoel Congo foi enforcado em praça pública, sendo-lhe negado até o direito de ser sepultado, pois seu corpo ficou exposto até começar a se decompor, sendo posteriormente descartado em local desconhecido.
O capitão mor Manuel Francisco Xavier faleceu no ano seguinte em 20 de agosto de 1840. Meses antes de sua morte, talvez numa tentativa de limpar sua consciência, deixou em seu testamento recomendações para que sua esposa continuasse a ajudar na edificação da igreja e providenciasse todos os móveis e ornamentos necessários para decora-la.
No inventário dos bens deixados como herança, entre as fazenda Freguesia e Maravilha haviam 449 escravos, sendo 381 homens e 68 mulheres, dos quais 80% eram africanos.
Viúva e herdeira de todos os bens do capitão mor, Dona Francisca Elisa Xavier, continuou tomando conta das propriedades deixadas por seu marido e não só ajudou a concluir as obras da igreja como também mandou construir uma casa paroquial e um cemitério no largo da praça da igreja com direito a capela, catacumbas e um ossário.
Na Fazenda Freguesia já não existia mais a primitiva capela de Nossa Senhora Da Conceição construída provisoriamente pelo capitão Francisco Tavares em 1739, no entanto há indícios de que a capela dedicada a São Francisco de Assis fora construída em meados do século XIX, por ordem de Dona Francisca Elisa.
A capela de São Francisco De Assis possui uma pequena varanda na entrada sustentada por duas colunas, e uma torre com sino do lado esquerdo. Em seu interior o piso é de pedras avermelhadas e possui bancos de madeira com genuflexório para que os fiéis tivessem onde se ajoelhar confortavelmente.
No final de sua vida Dona Francisca Elisa Xavier mudou-se para seu palacete em Niterói onde em 1854 recebeu do imperador Dom Pedro II o título de "1º Baronesa da Soledade", mas infelizmente faleceu no ano seguinte aos 68 anos.
Dos oito filhos de criação, para dona Francisca Elisa o tenente coronel Gil Francisco Xavier era seu preferido, tanto que em testamento foram deixadas para ele as Fazendas Freguesia e Maravilha, enquanto que para seus sete irmãos de criação a quantia de vinte cinco mil réis em terras e escravos para cada um.
O tenente Gil Francisco Xavier que herdara as fazendas Freguesia e Maravilha era um homem popular conhecido como "Gil da freguesia", ele se casou com Enidia Francisca Feijó Xavier entretanto não tiveram filhos.
Alguns diziam que ele gostava de jogos de aposta e por isso ao longo de sua vida foi perdendo grande parte de seu patrimônio, tanto que por volta de 1860 a Fazenda Freguesia possuía apenas 360 alqueires com 2.000 pés de café. Há relatos de que por vezes, até escravos de suas fazendas eram usados para quitar suas dívidas, causando déficit na mão de obra das lavouras.
Sobre a Fazenda Maravilha, ponto estratégico na "revolta de Manuel Congo", não há muitas informações ou qualquer registro em imagens que remontem a época. Resta apenas parte de um muro de pedras que cercava a casa sede.
Em meados de 1870 Gil hipotecou a Fazenda Freguesia quando em dívida com o Dr. Joaquim Teixeira De Castro. Sem condições de resgatar sua propriedade a fazenda passou definitivamente para seu credor.
Gil Francisco Xavier faleceu dez anos mais tarde, em 19 de novembro de 1880, aos 53 anos de idade, na mais profunda miséria e só não foi enterrado em cova rasa por intervenção de seu amigo Manuel Francisco Bernardes, que providenciou uma farda da guarda nacional para seu sepultamento, e uma cerimônia digna de um ex-militar.
O Dr. Joaquim Teixeira de Castro nasceu em 1825 na Freguesia de Arcozello no Porto em Portugal, desembarcando entre 1848 e 1849 no Brasil onde se formou médico. Chegou a Vila de Paty Do Alferes por intermédio do coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck que lhe convidara a exercer medicina em suas propriedades na região.
Na Fazenda Monte Alegre, por influência do Dr. Joaquim Teixeira de Castro que acabara de chegar na região, foi construído um hospital com nove enfermarias para atender mais de 200 escravos que trabalhavam nas roças de café e cana de açúcar. A propriedade era repleta de palmeiras patioba "pati" assim como na Fazenda Freguesia, reforçando a utilização desse nome para se referir a localidade.
A Fazenda Monte Alegre era de propriedade do coronel Francisco Peixoto de Lacerda Werneck (Barão de Paty Do Alferes), e sua esposa Maria Isabel de Assumpção Gomes Ribeiro De Avelar (Baronesa de Paty Do Alferes).
Dos nove filhos do Barão e da Baronesa, Maria Isabel Peixoto de Lacerda Werneck era a filha mais nova, e foi com ela que o Dr. Joaquim Teixeira de Castro se casou em 1855, juntos tiveram oito filhos: Ernesto, Francisco, Luís, Maria, Mário, Raul, Joaquim, e Sylvio. (Todos de sobrenome Werneck Teixeira De Castro).
Em 1862 faleceu o Barão de Paty Do Alferes, e quatro anos depois a Baronesa. Na divisão da herança, a parte destinada a Maria Isabel incluía a Fazenda Monte Alegre com todos os seus pertences, terras, plantação de café e 131 escravos; Fazenda Manga Larga com terras para exploração, 74 escravos, animais, gado, e mobílias; E a Fazenda Palmeiras com casa de negócio e moradia, 10.000 pés de café, 86 alqueires de terras, entre outros bens.
Em 1874, Joaquim solicitou ao Rei de Portugal, D. Luiz I, o título de "Visconde de Arcozello", nome da vila onde nasceu (freguesia de São Miguel de Arcozello), com a solicitação sendo aceita em 1876. No mesmo ano o agora Visconde de Arcozelo juntamente com sua esposa e filhos mudaram-se para a Fazenda Freguesia que teve o nome alterado para Fazenda Arcozelo em homenagem a sua terra natal.
A mudança para a Fazenda Arcozelo teve grande impacto em vários aspectos, otimização nas plantações, ampliação da senzala e levando em conta o interesse da Viscondessa pela culinária, algumas mudanças foram feitas na casa sede também.
Na segunda metade do século XIX as propriedades mais ricas passaram a ter duas cozinhas: uma com fogão a lenha e fornos feitos de barro, tachos de cobre e utensílios rudimentares utilizados pelas escravas, e outra com fogão de ferro fundido que consumia pouca lenha e produzia menos resíduos, nela ficavam também as louças, cristais, faqueiros e pratarias de uso exclusivo das "senhoras" e das mucamas de confiança.
Portanto é provável que a cozinha da fazenda tenha sido ampliada ou dividida para que a parte mais rústica ficasse no pavimento inferior, e a "cozinha limpa" em um dos cômodos do pavimento superior próximo a sala de jantar.
Seu prestígio e seus conhecimentos atrelados ao título de visconde e o patrimônio recebido como herança por sua esposa favoreceram os negócios do Dr. Joaquim Teixeira de Castro inclusive numa sociedade com Luiz Malafaia para abrir uma Casa Comissária de Café no Rio de Janeiro denominada Teixeira de Castro & Malafaia, acumulando fortuna suficiente para comprar de seu cunhado Luiz Peixoto de Lacerda Werneck a Fazenda Piedade deixada como herança por sua mãe, a Baronesa de Paty do Alferes.
Em 1887 a sociedade com Luiz Malafaia foi desfeita e a Casa Comissária de Café ficou sob a administração do visconde e seu filho mais velho Ernesto.
Joaquim Teixeira de Castro faleceu em 1891 vítima de febre amarela, seu filho permaneceu cuidando da empresa embora severamente afetada pela abolição da escravatura e o fim do ciclo do café, levando a sua liquidação dois anos mais tarde.
O visconde deixou um patrimônio que correspondia as fazendas: Monte Alegre, Arcozelo (antiga Freguesia), Piedade, Manga Larga, os sítios: Santa Thereza e Cachoeira. Além de prédios no Rio de Janeiro, terrenos em Iguaçu, e bens em Portugal.
A viúva Maria Isabel Peixoto de Lacerda Werneck (Texeira De Castro), viscondessa de Arcozelo permaneceu residindo na Fazenda Arcozelo, entretanto suas visitas à outras propriedades eram frequentes.
Em 1897 a Estrada de Ferro Melhoramentos do Brasil concluiu a construção de uma ferrovia partindo da capital e tendo como eixo a estação de Belém (Japeri), subindo pela serra, a linha passava por Estiva (Miguel Pereira), Paty Do Alferes, Paraíba Do Sul e Entre Rios (Três Rios).
Parte do trajeto da ferrovia aproveitava o primitivo traçado do Caminho Novo como o trecho a partir da estação de Paty do Alferes, localizada três quilômetros antes da Fazenda Arcozelo (antiga Freguesia).
A linha cruzava as terras da Fazenda Arcozelo, e após seguir à direita em uma curva fechada, alguns metros a frente no km 125,645 foi construída a estação de Arcozelo, tal qual o nome da propriedade que cedeu as terras para a passagem da ferrovia.
Nessa época as lavouras de café já não produziam o suficiente para exportação em massa, porém a ferrovia permitia inúmeras possibilidades como escoar outros produtos e melhorar significativamente o acesso a essa região.
A viscondessa de Arcozelo faleceu em 1912 na Fazenda Arcozelo, onde seus herdeiros gradativamente substituíram o cultivo de café por pequenas plantações e pastos para a criação de bovinos, caprinos, suínos e aves, focando principalmente na produção de laticínios.
Da estação de Arcozelo saía um braço de linha que se estendia para dentro das terras da fazenda para que os vagões pudessem ser carregados com mercadorias e puxados até a estação novamente onde eram acoplados de volta a composição e seguiam viagem.
Na imagem que mostra a ferrovia passando ao lado da fazenda, pode-se reparar nos fundos da casa sede uma construção mais escura que se trata de uma longa varanda fechada no pavimento superior sustentada por oito pequenos quartos no térreo, há indícios que essa modificação tenha acontecido nos primeiros anos do século XIX.
A varanda do pavimento superior contava com diversas janelas envidraçadas e o acesso era feito através de doze portas duplas.
Em 1931 a área da Fazenda Arcozelo possuía 140 alqueires sendo a maior parte usada como pasto e pequenas plantações.
Várias construções foram modificadas para atender as novas necessidades, como no caso da antiga senzala que com o fim da escravidão foi transformada em curral tendo dois silos anexados para estocar ração dos animais.
Em 1940 a Fazenda Arcozelo foi vendida para a Rural Colonizadora Sociedade Anônima, responsável por lotear grandes propriedades rurais ineficientes, reduzindo a área da fazenda para 60.000m².
Percebendo o potencial da região do vale do paraíba fluminense para a estadia de veranistas pertencentes a aristocracia, em 1945 o político João Pinheiro Da Silva Filho, filho do percursor do partido republicano em Minas Gerais, decidiu comprar o que restava da Fazenda Arcozelo afim de transforma-la em hotel fazenda.
Nascido em Caeté, Minas Gerais em 1902, João Pinheiro Da Silva Filho além de se formar em direito, foi sócio fundador do Instituto Brasileiro de Cultura, sendo um grande incentivador das artes.
Após a transformação em hotel fazenda, o casarão foi adaptado para uma nova realidade, dispondo de quartos nos dois pavimentos e condições para melhor proporcionar conforto durante a estadia dos hóspedes.
O casarão do século XVII passou por várias adaptações quando a propriedade foi convertida em hotel fazenda, uma delas foi a construção de uma varanda em "L" no pátio interno do casarão.
Com a nova varanda, foi aberta uma porta de acesso no canto da sala principal do pavimento superior.
Outras portas foram abertas para que demais cômodos também tivessem acesso a esse espaço.
As modificações realizadas tanto na adição da varanda externa quanto na interna afetaram o telhado que foi sobreposto removendo as características originais e causando falhas onde terminava um estilo e começava outro. Essa "falha" já havia ocorrido após a adição da varanda fechada dos fundos apoiada sobre quartos extras.
O estilo do armazém em frente a casa sede permanecia o mesmo da construção original e contava até com um sino para avisar da chegada de hóspedes. Nessa época não havia a varanda contornando essa construção, apenas um calçamento de pedras.
O Hotel Fazenda Arcozelo permitia que seus hóspedes tivessem uma imersão não apenas ao ambiente rural mas também à vida numa propriedade colonial.
O espaço antes usado como senzala, foi convertido em curral, galinheiro e capril. Os hóspedes podiam andar a cavalo ou passear de charrete pelos arredores, conhecendo um pouco sobre a vida no campo, além de provar alimentos direto da terra e laticínios diversos.
As fotos inéditas cedidas pelo amigo João Carlos Silva Cardoso mostram momentos de lazer de sua família durante a estadia no Hotel Fazenda Arcozelo na década de 1950.
Outra construção que foi totalmente transformada foi a área das baias onde ficavam os cavalos dos capatazes no tempo da escravidão. O que era um enorme galpão aberto foi convertido em um salão fechado com janelas de vidro que otimizavam a iluminação.
Esse espaço era muito versátil, e ao longo do tempo pode ter sido utilizado em diversas situações, no entanto é possível que nessa época já fosse utilizado como refeitório pois levando em consideração a quantidade de hóspedes, a sala de jantar da casa sede não teria condições de acomodar todos durante as refeições.
Com o falecimento do proprietário João Pinheiro Da Silva Filho em 1956, a falta de manutenção e cuidados necessários para manter o hotel fazenda fizeram o mesmo cair em desuso, entretanto em 1958 Paschoal Carlos Magno que visitava o local a convite de seu sobrinho, se encantou com a beleza da propriedade e viu a possibilidade de fundar ali um centro cultural capaz de abrigar a arte em suas mais diversas formas.
O projeto intitulado "Fundação João Pinheiro Filho" em homenagem ao antigo proprietário, foi apresentado aos netos de João Pinheiro que herdaram a fazenda e decidiram doar a Paschoal desde que fosse utilizada exclusivamente para atividades culturais.
Filho de imigrantes italianos, Paschoal Carlos Magno nasceu em 1906 no Rio De Janeiro, e desde cedo mostrou talento em diferentes áreas profissionais. Aos vinte anos fez sua estreia como ator de teatro, trabalhou escrevendo críticas literárias para "O Jornal", e em 1929 se formou em direito, mas seu maior interesse eram as artes.
Sua maior realização foi criar a Fundação João Pinheiro Filho popularmente conhecida como Aldeia De Arcozelo, um enorme complexo cultural dedicado às artes, localizado no coração do Vale do Paraíba fluminense.
Foram sete longos anos reformando a propriedade com 51,000m² sendo 10,000m² de área construída adaptadas ao projeto sem grandes alterações no estilo e na arquitetura das construções originais.
Em 19 de dezembro de 1965 cerca de cinco mil pessoas compareceram a inauguração do Centro Cultural Fundação João Pinheiro Filho, ou simplesmente Aldeia de Arcozelo.
Cada construção foi destinada a uma finalidade, recebendo o nome de importantes personalidades das artes.
O pavimento superior do casarão foi chamado de Museu Nicolau Carlos Magno, dedicado a exposições de obras de arte e objetos antigos originais da fazenda divididos ao longo dos dezoito quartos, oito salões, e uma grande varanda fechada nos fundos.
Além das obras de arte, no pavimento superior da casa sede havia móveis originais da Fazenda Freguesia/Arcozelo inclusive arte sacra e porcelanas finas. Grande parte da mobília original também foi mantida e organizada de forma que o estilo colonial fosse mantido.
Ao longo dos corredores vários quadros de arte abstrata levavam até uma capela dentro de um dos salões do pavimento superior. O altar de madeira por si só já era uma obra de arte, mas contava também com imagens de santos católicos de porcelana originais da época do café.
Nas paredes foram instalados lampiões elétricos vintage para uma iluminação sutil que não fugisse do estilo do casarão.
Logo na frente da parte térrea do casarão ficam dois escritórios localizados atrás da dupla escadaria, e um grande depósito protegido por grandes portões de madeira gradeada.
A chamada "Ala Heitor Ricco" corresponde aos alojamentos masculinos compostos por pequenos quartos localizados nos fundos do térreo do casarão debaixo da varanda fechada. Esta ala contava com dezesseis quartos ao longo do corredor localizado debaixo da varanda do pavimento superior, oito quartos dispostos na lateral direita e oito quartos na lateral esquerda.
No final desse corredor há uma antessala que possui em sua parede uma pintura alinhada ao corredor com efeito 3D que rendeu a esse local o apelido de "corredor sem fim". A pintura retrata o próprio Paschoal Carlos Magno que além de estar com uma veste franciscana, tem sua mão direita estendida enquanto segura um pergaminho com a esquerda.
Virando à esquerda há uma passagem que leva a outra ala também usada como dormitório e logo no início um banheiro coletivo. Nesse segundo corredor existem mais sete quartos maiores.
A revitalização promovida por Paschoal Carlos Magno restaurou o pátio interno e incluiu um chafariz ao centro. Apenas as janelas do tipo "guilhotina" são originais da fazenda, os modelos que se dividem e abrem para dentro ou para fora são de meados do século XX.
As belas janelas da fachada reluziam os novos vidros, e por dentro eram emoldurados por cortinas que controlavam a luminosidade do ambiente.
Da sacada do casarão, do lado direito está localizado uma das preciosidades da Aldeia: o anfiteatro ao ar livre.
Sombreado por frondosas árvores cobertas com "barbas de velho", o anfiteatro Itália Fausta tem capacidade para 1200 pessoas, e foi construído com blocos de pedra em formato semicircular sendo originalmente cercado por um muro branco com grades azuis e acabamentos de porcelana em cada coluna.
A parte do complexo chamada de "Ala do Teatro" era composta por varias subdivisões.
O prédio que servia como armazém com telhado bem elaborado entre a casa sede e o terreirão de café que se vê na imagem mais antiga da fazenda, ainda existe, mas passou por diversas modificações, entre elas a substituição por um telhado mais simples e a incorporação de uma varanda por toda a volta.
Essa construção foi dividida para abrigar diferentes espaços. A primeira sala foi chamada de Galeria Pancetti e contava com obras de arte e móveis antigos da fazenda.
Do outro lado desse mesmo prédio em frente ao anfiteatro estão a Sala de Música Padre José Maurício para 150 ouvintes, a Sala de Cinema Alberto Cavalcanti com 80 lugares e mais adiante o Teatro Renato Vianna com capacidade para 240 pessoas.
A varanda termina na entrada do Teatro Renato Viana, construído no mesmo estilo dos prédios originais.
Mais adiante, do lado esquerdo está a capela de São Francisco de Assis que na época foi totalmente reformada.
A capela de São Francisco de Assis era simples, contava com forro de madeira, um pequeno altar e luminárias nas paredes internas.
O coreto foi construído por Paschoal, e conta com uma escada em espiral e um banheiro na parte inferior. Está localizado ao lado da capela em frente ao cruzeiro que complementa o ambiente.
Atrás do cruzeiro há o sobrado que no térreo possui a sala Santa Rosa dedicada a cenografia localizada atrás do palco do teatro Renato Vianna, onde também ficava o camarim e um banheiro privativo.
Durante as obras para a criação do complexo cultural, no pavimento superior desse sobrado foram acrescentadas quatro sacadas no lugar de simples janelas. Era nesse local que ficavam as instalações de Paschoal, inclusive alguns itens foram preservados e expostos quando o espaço era aberto a visitação
Retornando pela varanda que circunda a "Ala do Teatro", à direita do casarão, após passar pela Galeria Pancetti, havia o Poema's bar e em seguida o Studio Bernardelli que possui uma passagem de acesso ao teatro.
Seguindo por essa varanda bem no final há mais duas salas.
Não foi possível identificar o nome de cada sala, no entanto, a última antes do refeitório era dedicada ao balé, com grandes espelhos nas paredes.
Virando à direita está a entrada para o salão do refeitório com uma vista panorâmica para um belo jardim gramado e repleto de árvores.
No pátio gramado foi construído um grande chafariz retangular.
O prédio que abrigava o refeitório contava também com uma cozinha industrial, e no espaço público havia mesas e bancos capazes de acomodar até 600 pessoas por vez.
Outro local contemplado com um chafariz foi o jardim lateral à esquerda do casarão onde também está localizada a Capela dos Escravos em homenagem aos homens e mulheres escravizados na época da rebelião de Manoel Congo.
Inicialmente dedicada a Nossa Senhora do Rosário e São Benedito, com o tempo a capela ganhou representações da Escrava Anastácia mártir dos escravizados e venerada por muitos católicos embora não seja oficialmente reconhecida como santa.
Com o resgate da história local nesse projeto de incentivo a cultura, a rebelião de Manoel Congo e Mariana Crioula bem como seus atos de bravura contra a tirania dos feitores fez com que nessa capela os homens e mulheres envolvidos também fossem homenageados.
No interior da capela foram reunidas também algumas peças originais da Fazenda Freguesia como um tronco, correntes e algemas; E segundo relatos, durante as obras de conversão do hotel fazenda em complexo cultural foram encontradas ossadas identificadas como sendo de escravizados que na ausência de mais informações foram enterradas no interior da capela.
Nessa nova fase, mudanças foram realizadas também do outro lado da antiga fazenda que na verdade sempre foi a entrada original. Lá o acesso era feito através de uma ponte de madeira sobre o rio do saco apoiada em duas robustas cabeceiras de pedras.
A ponte original simples e rústica ganhou um pórtico com telhas de barro de um lado do rio, e pilares de concreto com estátuas de porcelana do outro.
Durante a conversão do Hotel Fazenda Arcozelo em Centro Cultural, alguns metros antes da entrada original, foi aberto outro portão com colunas bem mais simples e com uma construção semelhante a uma guarita.
Entre esse novo portão e a entrada original da fazenda, existe um pequeno oratório construído dentro da propriedade. Infelizmente não há registros sobre os motivos, autores ou data de sua edificação.
Anos mais tarde esse portão foi substituído por um muro e as construções que haviam ali acabaram ruindo em decorrência do abandono.
Cerca de cinquenta metros à direita desse ponto fica a entrada original da Fazenda. Hoje restam apenas as colunas e um portão de ferro contemporâneos à década de 1940 quando o espaço foi transformado em hotel fazenda.
Como citado anteriormente, era desse lado da propriedade que havia uma conexão com a ferrovia através de uma bifurcação alguns metros antes da estação de Arcozelo, onde a linha principal que vinha do lado esquerdo e o braço de linha que se encontravam, com esse desvio descendo por uma estrada de terra à direita em direção a fazenda.
Em 1965, quando a Linha Auxiliar era administrada pela Estrada de Ferro Leopoldina, foi construída uma parada entre as estações de Paty Do Alferes e Arcozelo batizada como "Parada Paschoal Carlos Magno" em homenagem ao embaixador das artes que naquele ano inaugurava a Aldeia de Arcozelo.
Localizada no km 124,470, a Parada Paschoal Carlos Magno fica dois quilômetros depois da estação de Paty Do Alferes, não há registros conhecidos de como era sua estrutura, no entanto ainda existem ruínas no local que confirmam sua existência.
Uma imagem recente mostra vestígios da ferrovia desativada em 1997 como um trilho parcialmente soterrado, e o caminho por onde descia a antiga linha que seguia até a fazenda.
A linha que seguia rumo a fazenda descia por esse caminho à direita que hoje está cheio de construções, cruzava a estrada principal e seguia paralela a entrada original da fazenda.
Mais adiante existe uma pequena passagem sobre o rio do saco que ficou conhecida pelos moradores como "pinguela". Analisando sua estrutura, nota-se que a construção das cabeceiras é compatível com os pontilhões construídos pela E.F. Melhoramentos do Brasil / E.F. Central do Brasil.
Ao que tudo indica, o braço de linha que descia da estação de Arcozelo fazia a transposição do rio através desse pontilhão e entrava na fazenda.
Infelizmente entre 1950 e 1960 a ligação entre a ferrovia e o então Hotel Fazenda Arcozelo foi desativada e os trilhos removidos.
Na outra extremidade da fazenda, o longo prédio que originalmente abrigou a senzala e após a abolição da escravidão foi convertido em curral, foi totalmente modificada.
Essa construção que foi projetado para suportar grandes quantidades de seres vivos, agora dava lugar a uma escola com biblioteca particular, banheiros e toda dignidade que por anos foi negada aos seres humanos que ali foram mantidos em cativeiro como animais.
Os silos foram convertidos em torres de quatro andares interligadas por corredores e escadas e também equipados com banheiros, sendo utilizados como salas de aula ou alojamentos. O topo foi transformado em terraço com uma visão privilegiada do complexo cultural que era a Aldeia de Arcozelo.
A biblioteca localizada ao lado do sobrado de Paschoal contava com mais de cinco mil livros.
A construção mais longa, entre o sobrado e as torres (antigos silos), tem 12 metros de largura e 75 de comprimento e era dividida por um corredor que dava acesso a diversas salas de aula para turmas do "primário".
A escola foi o setor do grande complexo cultural que mais resistiu nos moldes idealizados por Paschoal.
Embora não fosse uma instituição religiosa, as crianças participavam das missas celebradas na capela de São Francisco de Assis. Era outro tempo, outros costumes.
Desde que se afastou de sua carreira política e diplomática por conta do golpe militar, Paschoal Carlos Magno dedicou-se fervorosamente em transformar a velha fazenda em refúgio para artistas dos mais variados seguimentos uma vez que a censura restringia cada vez mais as manifestações culturais.
Paschoal se desfez de diversos bens pessoais de sua casa em Santa Teresa, para investir na Aldeia, como foi o caso de seu piano de cauda para que pudesse construir uma piscina para os artistas hospedados nos alojamentos do grande complexo.
Os gastos para manter a Aldeia eram absurdos, Paschoal investiu tudo que tinha, e em 1979 fez um apelo desesperado na televisão em que ameaçava incendiar tudo. Sensibilizados muitos artistas e pessoas importantes fizeram doações, mas infelizmente o valor arrecadado não era suficiente para cobrir as dividas.
Ao contrário de seu desabafo em rede nacional, Paschoal dedicou-se a Aldeia enquanto pôde, e talvez por desgosto ou tristeza, faleceu no ano seguinte deixando um legado incrível e uma semente no interior do estado do Rio De Janeiro.
Com o falecimento de Paschoal Carlos Magno em 24 de maio de 1980, a Aldeia de Arcozelo nunca mais foi a mesma, nem teve como patrono alguém tão comprometido com as artes e a cultura como seu criador. Por decisão de seus herdeiros, em 1983 a Aldeia foi entregue para a antiga Secretaria de Cultura do Ministério da Educação e Cultura.
A parte mais intrigante diz respeito a uma construção que não existe mais, anexada ao casarão pela lateral direita. Esse prédio aparece em dois raros registros: um em 1922 e outro feito pelo meu avô Alexandre Faro em 1965.
No infográfico que descreve as funções de cada dependência do complexo, esse prédio consta apenas como "Alojamento Ana Neri", o que indica ser um alojamento feminino.
Comparando as duas imagens pode-se ver que a aparência mudou completamente em 40 anos.
Na fotografia de 1965 há doze janelas alinhadas na parte visível, e mais três na lateral que se encontra com a parte mais longa da construção em "L". Mas também é visível uma janela mais alta entre as alinhadas como um sótão, e aberturas próximas ao alicerce que lembram entradas para porões.
Analisando a imagem mais antiga, aparece na parte de baixo algo como fardos de feno, capim, ou até mesmo cana-de-açúcar. Já quanto ao prédio, há quatro janelas próximo a parede da casa-sede, quatro janelas na extremidade oposta, e três aberturas no centro na altura do piso interno do prédio.
Sabemos a utilidade desse espaço depois dos anos de reforma para converte-lo em alojamento, mas não há qualquer registro que indique sua utilização antes disso.
Em 1984 esse prédio ao lado da casa sede desabou e por questão de segurança as ruínas foram demolidas.
Grande parte foi soterrada, sem ninguém nunca investigar a fundo o que ficou debaixo dos destroços. Uma investigação arqueológica poderia encontrar artefatos perdidos no porão de valor histórico para incluir ao acervo da aldeia.
No início dos anos 2000 esse espaço foi transformado em horta e administrado pelas famílias que moram nas casas adjacentes. Mas muitas vezes o mato tomou conta de tudo.
Em 1987 por meio do processo Nº 1256-T-87 o IPHAN (Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional) oficializou o tombamento da propriedade e suas construções. O que era pra ser a garantia de preservação se tornou um pesadelo pois qualquer intervenção para reformar o complexo deveria ser aprovada por essa instituição que sempre teve padrões muitos severos e uma burocracia desanimadora.
Na década de 1990 após fortes chuvas o rio que corta a propriedade transbordou e sua correnteza levou embora tanto a ponte que dava acesso pela antiga entrada quanto a "pinguela" que se tornou passagem para os moradores.
A partir desse momento, a propriedade ficou dividida, restando do outro lado do rio apenas uma antiga casa que abandonada, acabou desabando recentemente.
Para evitar que as pessoas chegassem até a cabeceira da ponte, que nesse ponto se tornou um precipício, o local foi cercado e a visitação limitada até a área dos tanques na passagem coberta no centro dos alojamentos adjacentes.
Na passagem coberta que existe no meio dessa construção os dois grandes tanques e quatro bancos feitos de pedra e decorados com azulejos parecem ser construções originais.
No início dos anos 2000 a situação da capela de São Francisco também não era favorável. O telhado ameaçava desabar e misteriosamente o sino da torre desapareceu.
Os bancos de madeira foram colocados ao longo da varanda que cerca o jardim gramado e algumas imagens transferidas para a capela erguida em memória aos escravizados.
Ainda que a Aldeia não fosse mais o complexo cultural idealizado por Paschoal, muitos eventos foram realizados como apresentações de corais e grupos de teatro em ambientes abertos e fechados, shows, eventos anuais como a tradicional porém extinta Festa do Doce, e a exposição de orquídeas e bromélias que acontecia no refeitório, porém este foi o primeiro setor da Ala do Restaurante a ser interditado.
Havia o risco de desabamento do telhado devido o estado das madeiras corridas por cupins, e diversas frestas como é possível perceber pelos reflexos da luz do sol no chão. Além disso grandes rachaduras começaram a aparecer nas paredes, colocando em risco até a varanda.
Outro local fechado a visitação desde o início dos anos 2000 foi o pavimento superior do casarão. Do lado esquerdo da imagem há uma porta que leva para um pequeno corredor com duas entradas para o quarto principal e mais um quarto menor em seguida.
É interessante destacar que essa porta envidraçada no canto mais extremo do salão principal não é original, ela foi aberta para o acesso à uma varanda em "L" no pátio interno toda feita de madeira, adicionada na época em que a fazenda foi convertida em hotel.
Essa varanda que abrange o pavimento inferior e o superior foi fechada ainda na década de 1990 pois o madeiramento já estava muito deteriorado.
Dentre as raras imagens do pavimento superior do casarão compartilhadas publicamente, esse registro posterior a 2010 mostra que o perigo em acessar essas dependências é real. Infelizmente a varanda voltada para o pátio interno está condenada, e até mesmo a porta no final do corredor apodreceu e caiu.
Do lado direito do salão principal há uma grande passagem com duas portas de correr, que leva a outro salão do mesmo tamanho bem em cima do depósito.
Esse salão secundário era usado como sala de jantar na época em que o casarão era a sede da fazenda. As portas de correr parecem não ser originais, mas complementam o ambiente.
Este salão conta com três janelas frontais que compõe a bela fachada e duas janelas na lateral esquerda do casarão.
Analisando as plantas da construção em sua forma atual e imagens de alguns cômodos da casa sede quando o acesso era permitido, acredito ter encontrado vestígios de uma possível ligação interna entre o primeiro e o segundo pavimento logo atrás desse salão.
Nesse cômodo há também uma porta que leva para um corredor onde estão as demais dependências. É justamente atrás dessa porta que se encontra o local mais provável de ter sido o ponto de ligação com o pavimento inferior.
Logo à esquerda existe uma passagem que leva a varanda do pátio interno e dá acesso a dois dos quatro banheiros que evidentemente só foram construídos na segunda metade do século XX, portanto, antes dessa modificação esse espaço poderia perfeitamente comportar uma escadaria.
O depósito do pavimento inferior sustenta grande parte do corpo esquerdo do casarão começando sob a sala de jantar e abrangendo todos os quartos do pavimento superior. Nesse local se distinguem robustas toras de madeira presentes em todo prédio e colunas de concreto relativamente modernas que só existem nesse ponto, nelas estão apoiadas vigas alinhadas ao corredor.
Sobrepondo as plantas dos dois pavimentos, é possível perceber que os banheiros estão divididos sobre o quartinho que só se tem acesso pelo pátio interno, e o espaço entre as colunas e a parede que fecha o depósito.
Em 1981 a Aldeia de Arcozelo foi usada como locação para a gravação do filme "Os saltimbancos trapalhões". Dentre as diversas cenas gravadas nos dois pavimentos da casa sede, muitas delas se passam no depósito do pavimento inferior onde foi montada uma jaula ocupada na maior parte do tempo por um leão de circo.
Esses registros são de extrema importância para entender como era esse local no início da década de 1980 e se há indícios que corroboram a teoria de que de fato existiu uma escadaria ali. O curioso é que aparentemente nessa época não haviam colunas ou vigas de concreto, embora isso não descarte a possibilidade de ser o ponto de ligação entre os dois pavimentos.
Outra cena interessante mostra uma grade de ferro em uma das janelas do depósito de modo que é possível ver ao fundo parte da Capela dos Escravos no jardim lateral esquerdo.
Supondo que esse espaço era usado como cozinha, apenas os cativos de confiança e as mucamas podiam ter acesso a essa área, portanto essas grades poderiam ser originais, com a função de impedir invasões ou o compartilhamento de objetos de cozinha e alimentos de melhor qualidade.
Ao que tudo indica, as colunas e vigas de concreto datam entre meados das décadas de 1980 e 1990, ainda assim é plausível supor que exatamente nesse local havia sim uma escadaria, caso contrário a ligação entre o pavimento inferior e o pavimento superior se limitaria a dupla escadaria do lado de fora.
Baseado em outras fazendas construídas na mesma época, essas ilustrações mostram como seria uma escada disposta entre esses cômodos vista por cima próxima a sala de jantar e por baixo na suposta cozinha.
Até as toras que sustentam o pavimento superior e o piso do inferior se assemelham ao casarão da Aldeia.
Como atualmente o acesso a qualquer parte da casa sede é estritamente proibido, não foi possível procurar vestígios que confirmem a teoria de que o local que hoje é um depósito na verdade era a cozinha original da fazenda e contava com uma ligação que dava diretamente atrás da sala de jantar.
Seguindo pelo corredor do pavimento superior, além dos banheiros no início, desse lado existem sete quartos, um acesso à sacada, duas salas maiores, três salas menores e um banheiro geminado.
No final do corredor, antes da exuberante varanda fechada dos fundos com doze portas, uma das salas foi usada como capela após a inauguração do Museu Nicolau Carlos Magno. Todos esses cômodos ficaram inacessíveis ao público entre 1990 e 2000.
O belo piso de madeira apodreceu assim como o forro deteriorado pela ação de cupins e de infiltrações devido a irregularidades no telhado construído e reconstruído em períodos diferentes.
Os vidros das janelas quebraram ou soltaram de suas molduras, enquanto que as portas que separavam os ambientes desapareceram sem deixar vestígios.
Na lateral direita do casarão, vários buracos se abriram na altura das janelas do pavimento superior, e a deterioração dos cômodos nesse lado foi mais severa principalmente nos estribos e caibros tão antigos quanto o próprio prédio.
O embolso das paredes ruiu, e o esqueleto de madeira e barro ficou evidente. Nota-se que deste lado as primeiras janelas da fileira do térreo foram retiradas propositalmente.
Na lateral esquerda, a disposição das janelas entre o térreo e o pavimento superior sugerem que foram realizadas modificações em períodos diferentes, não só por estarem desalinhadas das janelas do pavimento superior, mas por serem de modelos totalmente diferente.
Existe uma inscrição adicionada por Paschoal na lateral esquerda da casa sede que sem dúvida mostra como todos, independente de suas crenças eram bem vindos na Aldeia de Arcozelo: "Aqui a religião é livre".
Na fachada poucas modificações foram feitas. As janelas do pavimento superior e a porta central são originais, já no térreo há indícios de que pelo menos uma das duas portas do lado direito da escadaria era na verdade uma janela. Inclusive em uma fotografia antiga no início dessa matéria é possível ver apenas uma porta nesse local.
Passando pelo portal entre a dupla escadaria, se tem acesso ao pátio interno que já não conta mais com o chafariz central. Até 2015 era possível entrar nesse pátio, mas a entrada nos cômodos que circundam esse espaço estava proibida.
Um raro registro mostra o interior de um dos quartos na lateral direita do térreo, e a situação de desgaste do madeiramento de sustentação do piso superior.
Na época em que ainda era permitido entrar no pátio interno, fotografei o mesmo quarto que aparece na imagem anterior, porém de outro ângulo. Comparando as duas imagens é evidente que a estrutura mudou bastante. O caixonete da porta não existe mais, e o embolso original teve que ser substituído por cimento.
Esse altar é igual ao que por muito tempo foi utilizado na capela dos escravizados, e hoje está na capela de São Francisco de Assis, o que difere são as cores, pois esse é branco com detalhes em dourado enquanto que o outro é branco e azul.
Através de um vídeo gravado durante o festival de teatro de 1972, por um breve instante é possível ver esse mesmo altar no fundo de um dos corredores do pavimento superior onde funcionava o Museu Nicolau Carlos Magno.
A parte dos fundos da casa sede onde havia a Ala Heitor Ricco também chamada de "corredor sem fim" logo foi fechada, onde as telhas que caíam eram reunidas aguardando uma futura restauração. Essa área já não era utilizada como alojamento desde a década de 1980.
Do lado de fora as janelas foram fechadas com tapumes de madeira e o local foi isolado com fita de interdição. A grande caixa d'água e a cisterna estão desativadas e também correm risco de desabar.
O único setor que ainda permanecia abertos a visitação era o prédio que fazia parte da "Ala do Teatro" onde funcionavam a Galeria Pancetti e a Sala de Música Padre José Maurício.
Na primeira sala, a Galeria Pancetti ficavam alguns quadros e os poucos móveis antigos que restaram.
Na sala ao lado que lamentavelmente sofria com goteiras devido a diversas telhas quebradas e caibros podres, havia um piano de cauda e alguns quadros.
Nem mesmo os jardins eram seguros pois muitas árvores estavam podres e corriam o risco de quebrar, dessa forma a Aldeia de Arcozelo foi definitivamente fechada a visitação.
O Teatro Renato Viana também sofria com o madeiramento deteriorado pela ação de cupins, telhas quebradas e infiltrações. Não era viável nem seguro entrar nesse espaço.
O belo muro com grades que cercava o anfiteatro Itália Fausta já não existe mais, no entanto as belas estátuas de porcelana que adornavam a entrada ainda existem, e foram colocadas no gramado em frente aos seus postos originais.
Essa ala que por muito tempo funcionou como escola, também foi usada como alojamento nos poucos eventos de teatro que aconteceram nos anos 2000 pois contava com diversas salas e banheiros.
O telhado em quatro águas localizado no meio desse prédio era a parte mais antiga da construção, seguia o mesmo formato de quando esse local era a senzala. Infelizmente mesmo com intervenções, em 2007 a junção da cobertura colapsou.
O prédio permaneceu sob o mesmo formato de quando servia como senzala, no entanto foram feitas aberturas nas paredes de pau a pique para que o local fosse usado como curral. Posteriormente foram usados tijolos maciços para reconstruir as paredes e criar divisões entre as salas da escola.
As árvores com mais de meio século envelheceram junto com a construção abandonada e sem manutenção. Cada vez que os galhos podres caíam sobre o telhado já fragilizado, causavam mais destruição.
Os dedicados funcionários recolheram as telhas que não foram danificadas e as guardaram em uma das antigas salas de aula para que um dia pudessem ser utilizadas novamente.
Com os buracos no telhado, a água da chuva alagava o corredor, as antigas salas, banheiros e quando secava deixava um rastro de lama.
Em algumas salas ainda restavam vestígios de bancos que provavelmente faziam parte de uma espécie de auditório.
Sempre houve certa tensão sobre a segurança nos silos, talvez por ser a construção mais alta, mais afastada, e menos utilizada. As passarelas adicionadas para ligar as duas torres bem como as escadas entre os cinco pavimentos sofreram severamente a ação do tempo, restringindo cada vez mais o acesso aos quatro pavimentos superiores.
Poucos tiveram o privilégio de desfrutar a visão do terraço. Já os "quartos" ou "salas" das torres eram basicamente pequenas salas de aula nos pavimentos criados dentro dos antigos silos.
O corpo das torres permanece com os mesmos tijolos originais, tendo sofrido apenas as modificações necessárias para criar as divisões entre os pavimentos além é claro das passarelas e escadas que fazem das duas torres um único prédio.
Do outro lado da propriedade o prédio comprido próximo a antiga entrada, também tinha quartos que eram usados como alojamentos complementares, sendo conectados por uma varanda ao longo de toda extensão.
Nos quartos onde o telhado não apresentava risco de desabamento, foram guardados alguns dos móveis da antiga escola e estrados das camas dos alojamentos.
Parte do telhado desses quartos também teve a estrutura danificada, alguns caibros foram provisoriamente substituídos por bambús mas infelizmente com o excesso de peso a cobertura desabou.
Como essa entrada da propriedade ficou inacessível sem a ponte, o caminho de pedras sobre o gramado foi dominado por uma vegetação selvagem que se apossou também das cercas laterais. As madeiras apodreceram e as pilastras cederam. Do outro lado do rio restaram apenas as duas colunas do pórtico onde tantas excursões foram recepcionadas.
Às margens da rodovia RJ-125, antiga Avenida Paschoal Carlos Magno ficam as três entradas da propriedade.
Perto dos antigos silos, no ponto mais extremo da propriedade há um portão para o acesso de veículos com duas colunas que sustentam uma cobertura, e um portão de ferro.
Cerca de duzentos metros a diante fica a entrada principal para pessoas, com seus robustos portões de ferro entre duas colunas de concreto em estilo colonial.
Cem metros depois, há uma segunda entrada para veículos que dá acesso a um enorme campo. O portão é simples e fica entre duas tronqueiras que parecem substituir colunas de concreto sem grandes detalhes.
Ao longo dos anos a ação do tempo impôs o fechamento de algumas áreas e limitou o acesso ao grande complexo. Fatores externos como a burocracia também prejudicaram intervenções que poderiam solucionar problemas estruturais e evitar desastres.
Durante a pandemia, na noite de 11 de março de 2021 houve um colapso na cobertura do teatro, o madeiramento corroído por cupins sucumbiu ao peso das telhas de barro úmidas e desabou abrindo um rombo no principal prédio que compõe a "ala do teatro".
Os danos foram muito além do que apenas a cobertura, até mesmo os bancos do auditório acabaram esmagados pelos caibros e telhas.
O Teatro Renato Viana, assim batizado por Paschoal sempre foi um lugar mágico com acústica incrível e um cheiro de madeira único, capaz de transportar os espectadores para além do espaço e tempo. E num piscar de olhos tudo se foi, da noite para o dia todos os momentos vividos ali ficaram apenas na memória.
Com a retirada dos escombros foi possível ter melhor dimensão dos estragos. O que se manteve sem maiores danos, foi coberto com plástico para proteger do sol e da chuva. Enquanto isso as autoridades começaram a traçar planos de ação para não permitir que o restante da construção desabasse.
O primeiro passo rumo a restauração da Aldeia de Arcozelo foi dado em 30 de agosto de 2021 quando o prefeito Juninho Bernardes entregou ao presidente da Funarte, Tamoio Athayde o documento de registro do imóvel, item indispensável para a captação de recursos e administração dos mesmos sobre o imóvel.
Logo foram iniciadas as obras de restauração da capela de São Francisco de Assis e do coreto.
No dia 14 de março de 2022 foi assinado um termo de cooperação entre a prefeitura de Paty Do Alferes através do prefeito Juninho Bernardes, e a Funarte afim de iniciar a recuperação das construções que compõe o complexo cultural da Aldeia de Arcozelo.
Na ocasião, a capela de São Francisco de Assis bem como o coreto foram oficialmente entregues totalmente reformados.
A cobertura da capela que apresentava o risco de desabar há anos recebeu a devida atenção com o telhado sendo refeito, assim como a parte elétrica. Os bancos com genuflexório puderam voltar, e o altar que ficava na capela dos escravizados voltou ao seu lugar de origem.
Entre a capela e o coreto, o pequeno espelho d'água também recebeu cuidados e uma pintura nova.
O coreto foi cuidadosamente reformado, o corrimão da escada lateral foi reconstruído após ter sido danificado por um galho pesado, os banheiros do térreo foram reformados com acessibilidade e mais conforto para os usuários.
Do outro lado, o sobrado utilizado por Paschoal durante sua estadia no complexo cultural estava programado para ser o novo foco das obras de revitalização e posteriormente transformado em museu do embaixador das artes, no entanto foi dada prioridade para áreas mais afetadas e com riscos.
No gramado foram empilhadas as telhas originais que não sofreram danos com o desabamento e também as retiradas da varanda e da Galeria Pancetti que embora não tenha sido afetada, estava sob risco.
Através da parceria com a Funarte, a prefeitura de Paty Do Alferes deu início a revitalização da "Ala da escola" com 1.842,81m² de área construída, e a restauração da "Ala do teatro", composta pelo teatro Renato Viana, Sala de Música Padre José Maurício, Sala de Cinema Alberto Cavalcanti que ultimamente era utilizada como sala administrativa, Galeria Pancetti, bistrô Poema's Bar, sala de balé, e banheiros.
O acervo que ficava nessas salas foi catalogado e retirado do local logo após o desabamento, dessa forma as partes do telhado que não cederam começaram a ser desmontadas sem o risco de danificar itens importantes.
Da mesma forma que dava uma enorme tristeza ver as construções em uma situação tão delicada, esse sentimento reforçava a esperança de que após essa fase difícil tudo ficaria tão lindo como nos velhos tempos e a Aldeia de Arcozelo voltaria a ser o mais importante cartão postal de Paty Do Alferes.
Mesmo despida das telhas de barro e entre árvores retorcidas pelo tempo, essas construções continuam encantando de qualquer ângulo.
Esses magníficos registros capturados pelo nobre amigo e fotógrafo oficial da prefeitura de Paty Do Alferes Milson Thuly revelam o tão aguardado renascimento de uma área com visitação restrita há anos.
Numa breve visita em junho de 2023 foi possível ver com mais detalhes o progresso das obras desse lado.
Todo espaço do Teatro Renato Viana teve as estruturas desmontadas e os destroços retirados para refazer o piso e reforçar a estrutura das paredes que não foram afetadas com o desabamento.
Das salas existentes entre o teatro e a Galeria Pancetti, do lado voltado para o anfiteatro, foi necessário retirar todo madeiramento corroído por cupins, inclusive as portas e janelas.
As telhas da varanda também foram retiradas e preservadas para serem reutilizadas.
Do outro lado da propriedade foi mais fácil registrar o avanço das obras da escola.
Segundo o projeto apresentado pela prefeitura, no prédio que compreendia a antiga "Ala da escola" deveria receber uma varanda ao longo de toda a parte de trás.
A varanda estava sendo construída voltada para o futuro pátio da escola.
Grande parte das telhas foram preservadas.
O telhado rebuscado que marcava o meio desse longo prédio preservava o mesmo estilo de quando esse espaço abrigava a senzala da fazenda, no entanto sua complexidade e a falta de manutenção levaram a deterioração e desabamento, dessa maneira foi decidido que a nova cobertura seguiria um único padrão.
As colunas de tijolos maciços que sustentam a cobertura, são mais recentes, datam do período em que a senzala foi convertida em curral e outras dependências para animais.
Toda a estrutura de madeira que fazia parte da cobertura foi desmontada.
Os caibros e vigas de madeira foram substituídos por estruturas de aço.
Finalizando a "Ala da escola" que agora volta a cumprir a função designada por Paschoal, os silos passaram por reformas estéticas e estruturais, ganhando paredes de tijolos vazados nas passarelas que interligam as duas torres.
Esse espaço abrigará seis salas para os professores. Há planos para a construção de uma quadra esportiva e outras dependências externas.
A reforma do longo prédio incluiu uma varanda voltada para a parte de trás da propriedade que foi devidamente cercada para garantir a segurança dos futuros alunos.
A área próxima aos silos, onde está sendo realizada a colocação de blocos servirá como estacionamento.
O muro às margens da RJ-125 que havia tombado para dentro foi substituído por grades de ferro que cercam e garantem maior segurança para o local.
É possível que essa antiga entrada para veículos seja utilizada como acesso oficial da escola.
As árvores saudáveis que não oferecem riscos ao prédio da escola foram preservadas.
A Aldeia de Arcozelo permanece sendo um grande complexo cultural no entanto, para melhor administrar os espaços, existe uma divisão entre a área educacional onde funcionará a escola municipal, e a área cultural que compreende o anfiteatro, o teatro, as galerias, o refeitório, os alojamentos, e a jóia mais preciosa que é o casarão do século XVIII.
Nesse primeiro momento apenas o sobrado, o teatro e as salas adjacentes estão prontas e abertas a visitação.
O calçamento de pedras divide o jardim onde se localiza o anfiteatro, a capela de São Francisco de Assis e o coreto, da antiga "ala do teatro".
O jardim recebeu iluminação especial que durante a noite formam um espetáculo a céu aberto.
As árvores do jardim em frente ao anfiteatro foram levemente podadas e preservadas, afinal seus galhos retorcidos e as "barbas de velho" tornaram-se parte da identidade desse local.
Como as paredes do teatro precisaram ser reconstruídas, mais uma porta foi aberta e está localizada à esquerda do auditório entre a primeira fila e o palco. Portanto agora a sala de teatro Renato Viana possui três portas com acessibilidade que também foram projetadas para a segurança em caso de eventual emergência.
Como já foi mostrado anteriormente, a capela de São Francisco de Assis e o coreto foram as primeiras construções a serem recuperadas, no entanto não estão abertas a visitação.
Curiosamente colocaram um pequeno sino na torre. O ideal seria encontrar o sino original, mas se ao menos providenciassem um sino proporcional a torre poderia compensar a ausência do original.
O coreto foi utilizado recentemente para apresentação musical, portanto está cumprindo com seu propósito.
Do outro lado atrás do cruzeiro (que também foi recuperado) está o sobrado de Paschoal onde haverá um museu em sua homenagem.
Do outro lado da "ala do teatro", é possível perceber que a varanda também foi reformada, recebeu um novo piso e aguarda apenas o paisagismo nos canteiros entre as pilastras.
Uma das entradas auxiliares do teatro recebeu rampa e corrimões. No momento está acontecendo uma exposição interessante nessa sala.
É interessante citar a preocupação com a segurança. A parte elétrica foi totalmente refeita, aparelhos de ar condicionado foram instalados, e em vários pontos há a presença de extintores de incêndio.
As salas que se tem acesso por essa varanda talvez não sejam utilizadas tal como foram projetadas, mas certamente serão destinadas a grandes propósitos.
No fim desse corredor estão duas grandes salas que só puderam ser fotografadas através das janelas.
O trabalho realizado nessa sala ficou incrível, desde o piso até o forro.
As obras no antigo refeitório já estão em progresso, uma pequena marcenaria foi improvisada e logo os trabalhos de restauração estrutural devem começar.
É possível ver se outro ângulo que essa construção está bem danificada, o telhado apresenta irregularidades, mas essa intervenção veio no momento certo, e ainda há tempo e pessoas dispostas a salvar todas as dependências.
Sobre o casarão, infelizmente as condições são outras. Por se tratar de uma construção tão antiga, não é qualquer procedimento que pode ser realizado para sua restauração, este será um grande investimento.
Realizar essa pesquisa e compartilhar a história desse pedacinho do paraíso por trás da serra do Rio De Janeiro é um enorme privilégio.
Espero que essa bela história nunca se perca, e que as futuras gerações possam encontrar nesse lugar magnífico o mesmo encanto que me inspirou a eternizar o que sei em imagens e palavras.