domingo, 27 de outubro de 2019

Estrada De Ferro Teresópolis: Da Ascensão ao Declínio (Parte 3)

Em 9 de março de 1957 a Estrada De Ferro Teresópolis teve as atividades encerradas entre Guapimirim e a região da Várzea onde a linha terminava.


Logo após a desativação desse trecho com cerca de 15,942 quilômetros o material rodante foi transferido para outros pátios onde acabaram sucateados, o pouco que sobrou foram os carros de passageiros, excelentes vagões reutilizados pela Leopoldina.


Os carros de passageiros mais luxuosos (vagões de 1ª classe) da E.F. Teresópolis foram transferidos para linhas operadas pela Leopoldina Railway em trechos mais valorizados, os demais foram realocados para operar em outros ramais.

A Leopoldina permaneceu operando o trecho de "subúrbio" entre a estação Barão De Mauá e a estação de Guapimirim (antiga Raiz da Serra).


Com a desativação do ramal na região da Serra, muitas obras da engenharia ferroviária acabaram abandonadas ou demolidas como por exemplo a estação da Várzea que após a desativação permaneceu abandonada e foi demolida entre 1958 e 1959.


A estação Alto Teresópolis, localizada bem no centro da cidade resistiu por mais alguns anos com sua forma original, mas como tantas outras foi convertida em terminal rodoviário para ônibus.


Outras construções que poderiam tiveram desfechos mais trágicos, e o caso da antiga estação Fazendinha usada para cargas; Foi demolida e nem mesmo a caixa d'água onde as locomotivas eram abastecidas foi poupada.

Só e possível reconhecer que nesse terreno um dia existiu uma estação pelas vigas de ferro que sustentavam a cobertura sobre a pequena plataforma.


Como e de praxe em ferrovias desativadas, os trilhos e dormentes são retirados, e no caso da Estrada De Ferro Teresópolis o trecho "serra a cima" foi totalmente erradicado, inclusive o terceiro trilho do sistema de cremalheira.


As pontes e viadutos geralmente dependiam de grandes estruturas de aço onde a via férrea era fixada. Com a retirada dos dormentes e dos trilhos, não era mais possível utilizar essas construções para atravessar de um ponto ao outro.


Outro que também teve os trilhos retirados foi o viaduto sobre a cachoeira do Garrafão, que numa fotografia tirada após a desativação do ramal e possível ver que apenas a estrutura do viaduto permaneceu montada.


E finalmente o viaduto mais polêmico da Estrada De Ferro Teresópolis, a ponte em arco construída sob administração da Estrada De Ferro Central Do Brasil para substituir a antiga ponte apoiada sobre três grandes pilares de pedra.


E interessante destacar que a construção dessa ponte e controversa, tudo porque já existia uma ponte no local que atendia perfeitamente as necessidades da ferrovia, mas com a E.F.C.B assumindo o ramal, seria bom para a imagem da estrada de ferro inaugurar uma estrutura que representasse a engenharia moderna.


Infelizmente essa ostentação não impediu o declínio do transporte ferroviário na região e essa foi apenas mais ponte que teve seus trilhos retirados do trecho serra acima.

Dois motivos levaram a prefeitura de Teresópolis a fechar o túnel na saída do bairro Cachoeira Guarani na atual Rua Beira Linha, o primeiro foi para manter a segurança para exploradores curiosos, moradores locais e para impedir que usuários de drogas ou desabrigados ocupassem o lugar.


O segundo motivo e que do outro lado do túnel existia uma fábrica de tecidos, a Sudamtex, e para garantir que pessoas não autorizadas tivessem acesso aos fundos da fábrica, era melhor fechar o túnel pelo menos de um lado.


A Sudamtex foi uma empresa têxtil aberta em Teresópolis na localidade da Várzea, inaugurada em 1965, oito anos após a desativação de parte da E.F. Teresópolis.

A própria natureza se encarregou de dificultar o acesso pelo outro lado, após anos sem ser utilizado nem passar por manutenções, alguns desmoronamentos fecharam parcialmente a outra entrada.


O túnel possuía 250 metros de comprimento.


Em 2013 tiveram início as obras de contenção de barreira na Rua Beira Linha próximo a antiga "boca do túnel", além do objetivo de evitar perigo eminente de desmoronamentos, a prefeitura pôs em prática algumas melhorias para a comunidade.


Na entrada concretada do túnel no lado do bairro Cascata Guarani a prefeitura realizou uma ação de reurbanização e para manter a segurança de todos, o antigo túnel permaneceu concretado mas recebeu uma nova pintura em homenagem a ferrovia que um dia passou por ali.


Na altura da estação de Barreira restaram alguns vestígios da ferrovia, e o que mais se destaca e a estrutura de ferro de uma antiga ponte ferroviária.


Após a retirada dos trilhos, a ponte foi adaptada para atender as necessidades dos moradores locais e para facilitar o acesso de visitantes.


Antes da chegada da ferrovia na região, existiu ali a Fazenda da Barreira, que servia de alojamento para tropeiros uma das construções que fazia parte dessa fazenda e a antiga capela de Nossa Senhora Da Conceição Do Soberbo que permanece preservada.


Na região próxima a raiz da serra, ficou cada vez mais difícil encontrar sinais da ferrovia que um dia passou por ali, vez ou outra e possível encontrar próximo a algum riacho colunas de pedra, construídas para sustentar pequenas pontes, hoje ausentes.


Com a extinção do trecho da Estrada De Ferro Teresópolis na serra, o trecho restante permaneceu em atividade sob a administração da Estrada De Ferro Leopoldina, que operava trens de subúrbio saindo da estação Barão De Mauá.


Enquanto a Estrada De Ferro Central Do Brasil apostava na eletrificação das linhas de subúrbio, tanto o Ramal de Guapimirim (ex: E.F. Teresópolis) quanto o Ramal de Inhomirim (ex: E.F. Príncipe do Grão Pará), operados pela Leopoldina, permaneciam com sistema obsoleto, principalmente no que diz respeito ao material rodante.

Com o fim da "era a vapor" nas ferrovias do Rio De Janeiro em 1973, coube a Leopoldina utilizar locomotivas a diesel para tracionar seus clássicos vagões de madeira.


Mas em 1975 o ramal de Guapimirim foi incorporado a Rede Ferroviária Federal, que instituiu a substituição dos antigos carros de madeira oriundos da Leopoldina por modelos capazes de comportar mais passageiros.


As novas composições eram formadas por carros de passageiros em aço de carbono, tracionados por locomotivas a diesel padronizadas com a pintura vermelha e amarela da RFFSA.


Embora muito tenha sido prometido para otimizar o transporte em massa na zona norte do Rio, para os "sub-ramais" de Vila Inhomirim e Guapimirim restaram apenas os "carros-reboque" de TUE's (Trem Unidade Elétrico) já fora de uso em outras linhas.


Em 1994 o governo federal deu inicio a privatização de empresas estatais inclusive a RFFSA, e a gestão do transporte de trens metropolitanos no Rio De Janeiro ficou a cargo da Companhia Fluminense de Trens Urbanos, a Flumitrens, uma empresa estadual criada para operar os trens nas linhas de subúrbio.


Em 1998 a Flumitrens foi absorvida pela Companhia Estadual de Engenharia de Transportes e Logística, a Central. 

A partir de 1998 os trens que antes partiam da estação Barão De Mauá passaram a sair da estação Central Do Brasil, além disso uma remodelação das linhas mudou consideravelmente o tráfego de trens no que restou do antigo ramal da E.F Teresópolis.


Nessa época no trecho entre a estação Central Do Brasil e a estação de Saracuruna, os trens circulavam em via de bitola larga e eletrificada, mas em Saracuruna era necessário fazer baldeação para continuar a viagem, uma linha seguia até Vila Inhomirim e a outra para Magé e depois Guapimirim, essas duas linhas permanecem em bitola métrica e sem rede eletrificada.


Durante a administração da Central Logística, houve uma melhoria razoável nas condições das locomotivas e todo material rodante utilizado no trecho.


Vagões limpos e sem marcas de vandalismo como e comum em trens de subúrbio.


Sob administração da Supervia desde 2011, o Ramal de Guapimirim (trecho da antiga Estrada De Ferro Teresópolis) permanece em atividade apesar das péssimas condições da via, das estações e do material rodante disponível atualmente. 


Os trens que trafegam neste trecho são compostos por vagões simples tracionados por uma locomotiva a diesel modelo U12.


Nem de passageiros nem metropolitano, o trem que percorre o pouco que sobrou da Estrada De Ferro Teresópolis se encaixa na categoria de "trem regional", e mesmo num ramal canibalizado, ainda fascina inúmeros entusiastas ferroviários, pois reafirma o poder que a ferrovia tem de encurtar as distâncias e unir diferentes caminhos, filosoficamente e literalmente.

segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Estrada De Ferro Teresópolis: Da Ascensão ao Declínio (Parte 2)

Para entender o curto tempo de atividade da Estrada De Ferro Teresópolis e preciso conhecer os caminhos alternativos que antecederam e os que sucederam a construção da ferrovia na região da Serra Dos Órgãos.


Antes da estrada de ferro, o único caminho ligando a capital ao município de Teresópolis era a velha "estrada de chão" rudimentar entre Magé e Sapucaia, até que por volta de 1836 o governo autorizou a contratação do capitão de ordenanças Francisco Leite Ribeiro para abrir um caminho que tornasse possível a passagem de carroças e carros de boi.


O árduo trabalho de desbravamento da mata atlântica em terreno irregular demorou cinco anos para ser concluído, uma das principais obras foi a construção da primeira ponte pênsil de madeira sobre o rio Paraíba do Sul entre Sapucaia e Mar de Espanha.


Em 1854 foi decidido pelos acionistas da Companhia da Estrada Magé a Sapucaia que deveria ser implantado uma linha de navegação entre a capital e a vila de Magé para complementar o trajeto pela estrada de chão.

Apesar dos esforços para melhorar as condições da Estrada Magé - Sapucaia afim de expandir o escoamento do café, em 1871 com a inaugurado da estação de Sapucaia no Ramal De Proto Novo da Estrada De Ferro Dom Pedro II, a maior parte dos serviços de carga foram transferidos para a ferrovia, tornando desnecessário o uso da Estrada Magé - Sapucaia para transporte de cargas brutas.


Em busca de aderir ao principal meio de transporte da época, o governo passou a estudar a possibilidade da construção de uma estrada de ferro que ligasse diretamente a capital com a cidade de Teresópolis, sendo inaugurado o primeiro trecho em 1896.


Embora o governo apostasse no transporte ferroviário, a estrada de rodagem ainda era necessária, por isso enquanto a estrada de ferro avançava serra a cima, a antiga estrada de chão recebia melhoramentos.


Em 1898 como parte da "estrada direta", as melhorias feitas entre Magé e Teresópolis surgiu a Estrada das Quatorze Voltas, a primeira ligação rodoviária com o Rio De Janeiro.

Dez anos depois, em 1908 o trem finalmente chegou a Teresópolis sendo então o principal meio de transporte entre a capital e a região serrana, a estrada de rodagem permaneceu paralela a ferrovia e durante esse tempo não recebeu grandes investimentos em infraestrutura e manutenção, enquanto isso a Estrada De Ferro Teresópolis se mantinha plena, oferecendo um excelente serviço para moradores locais e também para visitantes.


Em 1919 a Estrada De Ferro Teresópolis foi encampada pela Estrada De Ferro Central Do Brasil, que investiu alto em locomotivas e vagões importados da Suíça e da Inglaterra.


Na imagem acima está uma das locomotivas a vapor equipada com sistema de cremalheira Riggenbach. Na imagem abaixo está um dos carros de passageiros de madeira, geralmente cada composição era formada por um carro de 1ª classe e outro de 2ª classe.


Em 1920 começaram a surgir no Brasil as primeiras rodovias pavimentadas, e o transporte rodoviário passou a ser um forte concorrente do transporte ferroviário.

Já em 1926 foi inaugurada a estação Barão De Mauá da Leopoldina Railway, que nessa época concluía o trecho Saracuruna - Visconde De Itaboraí, num ramal para ligar o Rio De Janeiro a Vitória no Espirito Santo; Com cerca de 1,5 km essa linha chegou a Magé onde surgiu um entroncamento entre a Estrada De Ferro Leopoldina e a Estrada De Ferro Teresópolis.


Por volta de 1930 os trens para Teresópolis passaram a partir da estação Barão De Mauá no centro do Rio De Janeiro, mas foi em 1º de janeiro de 1932 que a Estrada De Ferro Teresópolis foi efetivada pela E.F.C.B para operar em conjunto com a Leopoldina.


Embora José Augusto Vieira fosse o responsável pela construção da Estrada De Ferro Teresópolis, seu filho Armando Vieira em 1932 já demonstrava interesse na ligação rodoviária entre a capital, e o município de Teresópolis, levando-o a fundar a Sociedade dos Amigos de Teresópolis, constituída por grandes empresários da época.

Para provar o comprometimento dessa associação com a construção da rodovia, seus benfeitores financiaram as obras de pavimentação do primeiro trecho, entre as localidades de Soberbo até o Alto da Serra, totalizando dois quilômetros demonstrando ao governo que a proposta traria benefícios para diversos setores.



Nos anos de 1940 o ramal de Teresópolis teve o tráfego intensificado na região da baixada devido ao aumento da população e dos passageiros atendidos pelo entroncamento da E.F. Teresópolis com a E.F. Leopoldina.


De fato o transporte ferroviário estava ameaçado pois a viagem de trem entre a capital e Teresópolis durava quase três horas, enquanto a rodovia poderia reduzir esse tempo para uma hora e meia de carro. Então em 1948 começaram os preparativos para a construção da rodovia Rio - Teresópolis.


Os arquitetos responsáveis por traçar o percurso da rodovia decidiram que as obras teriam início nas proximidades de Magé, passaria por Guapimirim e em seguida galgaria a Serra, atravessando os vales dos rios Soberbo e Garrafão, e vencendo a serra da Garganta do Soberbo, a mais de 950 metros de altitude. 


Essa seria uma missão muito difícil de ser executada com a tecnologia disponível na época, tanto que muitos trabalhadores perderam suas vidas por conta dos desmoronamentos, explosões mal sucedidas, e quedas de precipícios.


Mas apesar dos incentivos financeiros por parte do governo as obras da rodovia avançavam a passos lentos, e o trem permanecia como a melhor opção de transporte.


A política de liquidação das ferrovias deficitárias que extinguiu vários ramais no estado do Rio De Janeiro também ameaçava a sobrevivência da E.F. Teresópolis, a construção da rodovia apenas reforçava a conclusão lógica de que não haveria necessidade de manter a operação dos trens no trecho da serra.


A Estrada De Ferro Teresópolis que agora era administrada pela Leopoldina Railway e pela Central teve o trecho Guapimirim (Raiz Da Serra) - José Augusto Vieira (Várzea) desativado em 1957 quando o trem desceu a serra pela última vez. 


As obras na rodovia foram concluídas como BR-4 no Plano Rodoviário Nacional, atravessando a região da baixada fluminense, passando por Teresópolis e se estendendo para o Norte do país. Sendo que o trecho na Serra Dos Órgãos só foi inaugurado em 1º de agosto de 1959 com a presença do então presidente Juscelino Kubstichek.


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